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sobre estados de alma e outras insignificâncias... :)
sim, a distância. é a distância que nos torna insensíveis. cegos. surdos. a distância que nos impusemos ou nos foi imposta. os muros que construimos ou criámos. as portas, as belas fachadas. a distância. distância a que está o sítio onde mantiveram cativo, alimentaram e mataram o frango que temos no prato. distância que vai daqui ao fundo da rua, onde vivem "aqueles do turbante" ou os ciganos, a distância que vai do meu jardim cuidadosamente vedado às janelas sem cortinas dos quartos onde 8 dormem apinhados. a distância que vai do trilho que percorro a ouvir música todas as manhãs à encosta mansa em que os ciganos dormem sob uma tenda de mantas velhas. a distância a que se colocam casas de repouso onde guardamos os que já nos ficam velhos. fora da nossa rua, da nossa vida. longe do nosso bairro. longe. é difícil vir mais, sabe, fica tão longe! é a distância a que são tratadas, colhidas e embaladas por mãos que dormem apinhadas as frutas doces com que nos regalamos à tarde, ao sol. e é a distância a que nos colocamos quando dizemos "estão a sacrificar o ambiente em prol do dinheiro". estão. eles. os outros. os que não nos tocam, não nos são próximos, estão afastados. à distância. é não ver a perna insegura que luta para subir o degrau, dia após dia, várias vezes ao dia, apoiada por mãos já trémulas, é não ouvir quem já não ouve, quem já não canta porque a voz se engasga. estar longe, mesmo que ali ao lado. é virar as costas ao gatos vadios, que só sujam as ruas, é o passar de largo. é ir pelo caminho mais longo porque a meio do mais curto há um semáforo perto do qual, invariavelmente, alguém nos pede alguma coisa. é a distância. é a distância que nos permite fechar os olhos e dormir tranquilos. não ouvir, não ver. a distância. é a distância que nos permite ignorar as atrocidades da vida. até quando?
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